Em abril deste ano, o município de Poço Redondo (Alto Sertão do estado de Sergipe) foi ventre de uma exposição que alçaria voos e despertaria reflexões. “Poço Redondo (Em Brenhas)”, do artista visual Matheus Cordeiro, fez ponta em Nossa Senhora da Glória, Nossa Senhora do Socorro e na capital Aracaju (Arraiá do Povo e Museu da Gente Sergipana) em prol de um objetivo: relembrar a potência cultural poço-redondense, bem como a invisibilização que ela sofre.
Através da associação do mato que cresce e oculta coisas, Matheus revela que isso não é somente um jeito poético para exprimir sua crítica e, sim, uma demonstração crua e recorrente do que acontece não só em seu município, mas no Alto Sertão como um todo:
“Percebo – assim como todos os fazedores e fazedoras de arte/cultura daqui – a sensação de estarmos diante de uma ‘parede de mato’ ao tentarmos manter e levar nossos saberes e fazeres ao conhecimento do público dentro e fora de onde estamos. Ao mesmo tempo em que buscamos amplitude e maior recepção, essa brenha nos oculta e ficamos apenas com a poética que nos é dada como ‘lugares exóticos monótonos e curiosos’ – porém longínquos demais – reféns de uma visão rasa que nos subestima, principalmente quando alguns conseguem atravessar e frequentar espaços externos de troca. Atuamos tanto no despertar do olhar de onde vivemos, quanto nos que são de fora para avançarmos e isso é exaustão em dobro. Esse esforço, digo e repito, precisa ser apoiado e mais valorizado. ‘O sertanejo é, antes de tudo, um forte’, mas não um romantizador do sofrimento ao qual é posto.”
Mesmo diante de tal cenário, o artista não deixa de apontar observações promissoras e positivas sobre a recepção do público por onde passou com o projeto. Segundo ele, ao evocar as brenhas no seu trabalho, segue a ideia de converter os “matagais” em “cortinas” como uma maneira de driblar esse obstáculo e dar abertura para outros talentos locais:
“É recompensador presenciar o público disposto a entender, compreender a mensagem e querer enveredar no município. Poço Redondo abriga muitos saberes/fazeres, localizações, marcos, relatos e fatos de grande importância histórica/cultural para Sergipe que precisam ser conhecidos (e reconhecidos). O que estou fazendo é apenas a minha contribuição dentro das linguagens nas quais trabalho, jamais terei a ambição tola de pensar que esse projeto fala por todos/todas/todes do município e sua gama de pluralidade. Espero – bem como persevero – que todos da arte/cultura da minha terra (e do Alto sertão em si) tenham oportunidades mais recorrentes de ocupar tais espaços e mostrar suas perspectivas em outros lugares. Esse é o fermento que gira a engrenagem da nossa cultura.
E por falar em perspectivas, é instigante revisitar o trabalho conforme ele vai residindo em outras casas. O conceito de ‘BRENHAS’ vem se tornando quase um termo filosófico, adquirindo novas camadas dentro da causa que me propus desde o início. Aquilo que inicialmente era uma ‘entidade-daninha’ (e de fato é) ilustrando a invisibilização cultural, está se convertendo em um ‘cartão de visita agridoce’ para o que espera por detrás delas. Porém, não as glamourizo, pois elas são agressivas e permanecem sendo antagonistas. Sinto que elas podem ser convertidas em um propósito construtivo e contra si mesma. Feitas para esconder, só que agora intrigando e destacando os ocultados. Que as brenhas que escondem, agora sejam cortinas.”